sexta-feira, 1 de abril de 2011

Tapando o sol com a peneira.



Pouco adianta o resfriamento de Fukushima

(ENTREVISTA AO JORNALISTA Dirk-Oliver Heckmann)

Edmund Lengfelder considera que são “riscos inúteis” as tentativas de salvamento do reator de Fukushima. A usina nuclear deveria ser blindada como foi feito em Chernobyl – e a zona de evacuação aumentada para 50km.

Dirk-Oliver Heckmann: Nós já reportamos de diferentes maneiras neste programa: o governo japonês considera publicamente que aconteceu um derretimento parcial e passageiro do núcleo do reator de Fukushima. E sobre isso e seu significado, eu converso agora com Edmund Lengfelder. Ele é diretor do Instituto de Radioproteção Otto Hug, em Munique. Bom dia!

Edmund Lengfelder: Bom dia!

Heckmann: Sr. Lengfelder, um derretimento do núcleo passageiro e parcial, o que isso significa do seu ponto de vista?

Lengfelder: Naturalmente isso é uma banalização da situação, pois o derretimento do núcleo não aconteceu em apenas um, mas já em um segundo reator. E passageiro, isto é uma verdadeira desinformação para a sociedade.

Heckmann: Em que sentido? Por que é uma desinformação?

Lengfelder: O derretimento do núcleo do reator já aconteceu há um bom tempo. Podemos concluir isso frente à liberação dos correspondentes radioisótopos. E depois que não é mais possível um resfriamento e as varetas de combustível nuclear e possivelmente também todo o conjunto no compartimento estão reagindo, forçosamente está acontecendo o derretimento do núcleo, e ele durará ainda por um bom tempo.

Heckmann: O governo japonês afirma que nós fazemos tudo para cessar o derretimento do núcleo, à medida que resfriamos o reator com água do mar e, agora, com água doce.

Lengfelder: Eu penso que trata-se novamente apenas de uma tentativa, e tenho pena das pessoas que são enviadas às proximidades do reator ou dos reatores para injetar água. Eu vejo nisso um procedimento inútil tentando ainda brecar o processo, onde para mim não há mais nada para fazer. À vista da alta radiação, é importante que as pessoas sejam evacuadas para longe. E a distância que considero necessário, sem ter quaisquer dados colhidos in loco, seria certamente um raio de 50 km ou mais.

Heckmann: Isso quer dizer, se eu entendi direito, você afirma que o derretimento do núcleo que está acontecendo, não tem mais como ser impedido de alguma forma?

Lengfelder: Sim, é assim que eu vejo a situação. O derretimento pode ser contido quando as coisas tomarem seus rumos, a massa derretida penetra então pelo edifício, e devido a processos físicos normais, ela se espalha por uma grande área e com isso, se esfria automaticamente. Mas a introdução de água externa não altera muito nesta situação.

Heckmann: Quer dizer, você seria favorável à não-intervenção neste reator avariado ou deixar a sua própria sorte estes quatro reatores danificados?

Lengfelder: Sempre se tentará fazer alguma coisa. Caso considerarmos a experiência que os russos tiveram em Chernobyl, então nós enviamos pessoas para lá, eu gostaria de usar esta expressão, como bucha de canhão, na tentativa de se salvar alguma coisa. Tentaram evitar o pior em Chernobyl com chumbo, boro e areia, porém, devido à explosão a situação era um pouco diferente da atual em Fukushima. Portanto, eu vejo pouca possibilidade de ainda se evitar alguma coisa.

Heckmann: Pouca ou nenhuma?

Lengfelder: Pouca, realmente pouca. É irrelevante. O que mais dá resultado é evitar a exposição da população a mais radiação através de ampliação da evacuação.

Heckmann: Quer dizer que a evacuação é a única medida que pode ser tomada em seu ponto de vista para proteger as pessoas. Quando seguimos seu raciocínio e afirmamos – o derretimento não pode ser cessado – o que significa isto para o meio-ambiente no Japão? O que isto significa se o derretimento do núcleo estiver a todo vapor?

Lengfelder: O derretimento do núcleo vai se extinguir por si só em algum momento, quando o metal derretido das varetas e dos compartimentos se espalhar por uma grande área e se fundir com a areia, com a terra do subsolo e com o concreto do edifício do reator, formando uma enorme massa que irá se resfriar lentamente ao longo de muitos anos.

Heckmann: Mas isso quer dizer a contaminação radioativa de grande parte da região, ou também é possível poder limitá-la nesta área?

Lengfelder: O problema é sempre que enquanto o ou os reatores não estiverem tampados, como também foi o caso de Chernobyl, através de um sarcófago ou com areia, uma gigantesca montanha de areia, a radiação continuará a sair na foram de gases, os quais são fomentados ainda pelo vapor que é gerado pela injeção d’água. E enquanto esta liberação gasosa não for contida, continuaremos a ter disseminação de radiação e contaminação da população.

Heckmann: E com quais conseqüências para a ecologia?

Lengfelder: Eu penso que no momento a ecologia está em segundo lugar. Primeiramente as pessoas devem ser protegidas e depois podemos pensar em qual dimensão e extensão esta área deverá ser decretada como zona proibida, análogo ao caso de Chernobyl. Deverá ser estabelecida uma grane área proibida e sua dimensão será determinada segundo os dados apurados posteriormente.

Heckmann: Para finalizar: como você avaliaria o gerenciamento desta crise pelo governo japonês?

Lengfelder: Comparando agora, nós temos bastante experiência como os soviéticos e russos lidaram com isso – os russos trabalharam isso de forma mais conseqüente e evacuaram mais rápido e em maior escala. Eu não considero bom este gerenciamento da crise e, de fato, não é bom e não é confiável. Os japoneses, claro, tem outro problema, pois a densidade populacional é 20 vezes maior do que a da região de Chernobyl. Junto com isso, há o problema da destruição da infra-estrutura pelo terremoto, e isso é um desafio que mesmo um país de elevada tecnologia como o Japão não pode se permitir.

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